terça-feira, 2 de novembro de 2010

Ícaro

            Na semana em que fomos para São Paulo fazer nosso visto pra França visitamos o Museu do Ipiranga. Num dos corredores estava exposta uma réplica em tamanho reduzido da estátua de Ícaro.  Ao lado dela, uma placa dizia que o monumento original era em homenagem a Santos Dumont e estava exposto numa praça com o nome do aviador na França. Em frente ao Ícaro de São Paulo eu prometi para mim mesma que, se tudo desse certo com o visto, eu iria visitar o monumento da França.
           Essa semana eu comecei os preparativos para cumprir a promessa. Procurei no Google Earth e descobri que a estátua fica dentro da Île de France, ao lado de Paris, numa comuna chamada Saint-Cloud. Como a estátua fica próxima ao Bois de Boulogne, desenhei o roteiro e propus ao Doug a aventura que nos renderia perto de dez quilômetros de caminhada. Como viram, um serviço parecido com o de descobrir o destino do Santo Graal.
           Equipamos a mochila com os mantimentos necessários - mapa, comida, água e máquina fotográfica - e saímos ainda de manhã ao encontro de Ícaro. Pegamos o RER até o Châtelet, depois a linha 1 do metrô até o Porte de Maillot, e o restante do trajeto fizemos a pé. Como o Bois de Boulogne é gigantesco, eu escolhi algumas coisas que seriam interessantes ver e  planejei cada trilha que iríamos seguir.
            A saída do metrô foi um pouco complicada, pois estávamos numa rótula, com poucas faixas de segurança.  Depois de uma maratona por sinaleiras e ruas movimentadas, encontramos a Allée de Longchamp, que é a que nos levaria até o bosque. Ali a paisagem já começou a mudar: em vez de prédios, muitas árvores, e, em vez de carros, pessoas passeando e pássaros de todo tipo sobrevoando o lugar. Numa das ruas perpendiculares, seguindo o meu mapa, entramos para procurar o Lac Inférieur. Esse segundo trajeto era mais bonito ainda que o primeiro, pois a rua era mais estreita, e as trilhas no meio do mato mais visíveis. Estávamos conversando sobre aquela beleza quando o Doug parou de falar ao ver o movimento de uns arbustos ao lado da trilha. Um coelho, disse ele. E lá fui eu como a Alice, atrás do coelho pelo mato. Porém, o veloz orelhudo me deixou chegar bem pertinho e ainda fez pose para a foto antes de sair apressado.
           Seguimos nosso percurso falando do coelho e fomos surpreendidos por uma das paisagens mais lindas que vi na vida: um lago gigante, cheio de cisnes, patos e outras aves coloridas. No meio do lago, tem uma ilha com um gramado uniforme, muitas flores e sendas. Além de tudo isso, o lago é cercado por muitas árvores, que, agora no outono, ganham cores vibrantes.
           Entre uma foto e outra, um simpático francês que estava correndo parou ao nosso lado e se ofereceu para bater uma foto. Aceitamos a gentileza e, depois do registro, ele pediu de onde éramos. “Nous sommes brésiliens”, respondemos. Ele abriu um sorrisão e disse: Oh, Brésil! E, já correndo de novo, ele olhou pra trás e gritou em inglês, que é a língua oficial dos franceses que falam com estrangeiros de qualquer parte: Congratulations for Dilma!  
           Agradecemos as felicitações e continuamos contornando o lago. Aí surgiu uma dúvida cruel. Tínhamos duas opções: atravessar o lago e, consequentemente, ficar ali o dia todo ou seguir meus planos até o Ícaro. Com uma insistência minha e com a promessa de que voltaríamos outro dia para ficar o dia inteiro no lago, seguimos adiante. Pegamos a Rue Grande Cascade e fomos em direção ao Parc Bagatelle, só que, ao contrário do nome, para entrar teríamos que pagar 5 euros cada um.

            Assim, optamos por não ficar nesse parque também. Não pelo dinheiro, mas porque valeria mais a pena retornar em outra ocasião e ficar mais tempo. Voltamos para a Allée de Longchamp e andamos até encontrarmos a cascata que era uma das paradas do meu roteiro. Subimos ao lado da cachoeira e, como sempre faço aqui em Paris quando avisto uma rua estreita, dediquei alguns minutos a ela, e acabei me enfiando por uma escada de pedras escorregadias.
            Eu nunca me arrependo. Dez degraus e estávamos dentro de uma gruta, e a cascata agora podia ser vista de dentro pra fora. Quando cheguei ao lugar que tinha descoberto, comecei a gargalhar sozinha fazendo a gruta tremer e ecoar minha felicidade, o que fez com que o Doug viesse ao meu encontro. Mesmo assim, ele demorou um pouco pra chegar, pois na descida a escada faz uma curva tão tênue, e a passagem é tão estreita que, se você não olhar direito, pensa que o trajeto termina por ali.
              
           Saímos da cascata inebriados com a sua beleza e contornamos o Hippodrome de Longchamp até achar as margens do Sena.  Andamos quase um quilômetro em paralelo ao charmoso rio e encontramos a Passarelle de l’Avre, que passa por cima do Sena e também de uma ruas da comuna de Saint-Cloud. A passarela de madeira é lindíssima e nos proporcionou mais umas vistas deslumbrantes. Quando estávamos no finalzinho da passarela, olhamos para trás; e o que vimos? Adivinhem! A Torre Eiffel! Paramos na hora para curtir o espetáculo visual: o Sena e as árvores se agitando com o vento e a torre imóvel e poderosa no horizonte.  
            Terminando o percurso da passarela, já estávamos fora de Paris, e encontramos umas ruas estreitas e graciosas cheias de casas que mais pareciam castelos, com traços de arquitetura alemã. E foi andando por aquelas ruas coloridas que avistei as asas do Ícaro. Chegando mais perto, pude vê-lo por inteiro, solitário no meio de uma pequena praça. Ainda ofegante pela caminhada de horas, não resisti aos seus braços abertos e lhe dei um abraço emocionado.
Valeu a pena encontrá-lo. Se não fosse por ele, talvez não tivéssemos visto todas aquelas maravilhas. Mas claro que meus mapas ajudaram, pois com eles não é preciso ter fio de Ariadne para não se perder no labirinto dos paradisíacos bosques de Paris.








 

 




 

5 comentários:

  1. LINDÍSSIMO! LINDÍSSIMO!


    Valeu por compartilhar esses momentos. Estamos aí com vocês.

    As fotos estão cada vez melhores.

    A sim, farei um pedido: Vão vocês a um bar bem boêmio e batam fotos. Bêbados, de preferência.

    Não deixem seus pais lerem este comentário.

    Ativa aí o bloqueio dos pais. :-)

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  2. Bah! Tchê! Só interjeições (e regionais!), o que mais posso dizer?

    Esses lugares são demais! Estas cores! Bah...Quero uma Paris pra mim! Em Janeiro estou de aniversário
    :-)

    Abraços saudosos!

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  3. Mon amie!

    Estamos esperando a sua visita. O bom é que já tenho todos os mapas prontos para te mostrar a cidade.rsrs

    Abraços

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  4. Pode deixar Jônatas, o próximo bar que a gente for eu registrarei e farei um post alcoólico pra você.

    Abraço

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  5. Lindo!!! Por isso q os pintores impressionistas viviam em Paris...

    Quando vi um Renoir pela primeira vez imaginei q as árvores de Paris eram diferentes das nossas. Realmente eles viviam cercados dessas cores. Claro q dá vontade de sair pintando árvores roxas e folhas amarelas... É de verdade e é lindo!!

    E Doug tá mais magrinho!!

    Beijokas

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