Hoje o dia foi o oposto de ontem. Repito o que já disse em outro post: a vida aqui em Paris é muito intensa. Ontem fomos até a Sorbonne para tentar fazer a minha inscrição num curso de francês. Pegamos uma ficha de número 40 na entrada e sentamos. As moças que estavam atendendo estavam chamando o número 20, ou seja, tínhamos muito tempo de espera pela frente. Quando chegaram ao número 30, elas começaram a pedir se tinha alunos antigos da escola, e aí começou a confusão. Desceu uma dezena deles e passaram todos na nossa frente, fora as pessoas que chegavam lá pra pedir informação sem ter pego a ficha com o número e mesmo assim eram atendidas. Comecei a ficar com um ódio tremendo daquilo. O Douglas tentava me acalmar, mas chegou uma hora que eu comecei a deixá-lo nervoso também. Enfim, depois de duas horas, fomos atendidos.
Não consegui disfarçar: sentei em frente à mulher e larguei um suspiro de alívio. Ela riu e disse que tinha bastante gente mesmo. Acho que ela não entendeu a minha interjeição, mas tudo bem. Eu simplesmente sorri de volta e comecei a falar. Eu já tinha pesquisado na internet e sabia exatamente qual o curso que eu queria fazer; mas descobri naquele momento que aquela fila toda era pra explicar o que eu já sabia e pra pegar uma convocação para, no dia seguinte (hoje), fazer a inscrição do curso. Eu só precisaria do passaporte, diploma de ensino superior traduzido (graças a Deus eu fiz ainda no Brasil) e pagar. Só tinha um detalhe: a única forma de pagamento que eles não aceitavam era em dinheiro. Como assim? – Não aceitamos dinheiro, disse a moça, você terá que pagar com cartão ou fazer um depósito para a Fondation Sorbon, e me deu os endereços de onde eu poderia fazer o depósito. Pra mim o cartão estava fora de cogitação, pois as taxas de cartão de crédito internacional são absurdas e proporcionais ao valor utilizado, que nesse caso era bem alto. Corremos dali em direção à agência que ela indicou, pois já eram quatro horas da tarde, e a inscrição pra hoje estava marcada para as 10:30; não daria tempo de depositar.
A moça do banco nos deu um envelope de plástico e explicou o que eu teria que preencher. Eu peguei o envelope e fiquei olhando pra ela. Queria perguntar se podia escrever ali mesmo e se ela me emprestaria uma caneta, mas as palavras em francês demoraram pra passar do cérebro para a boca, então ela começou a me explicar tudo de novo, só que dessa vez em inglês. Naquele momento eu tive vontade de pegar a mulher pelo pescoço e começar a gritar: EU JÁ ENTENDI ISSO, QUERO SABER SE TU ME EMPRESTA UMA CANETA!!!!!!!!!! Nisso o Douglas viu uma mesinha mais adiante com uma caneta em cima e me puxou. Preenchemos o tal papel, colocamos a grana dentro e fomos embora. Chegando em casa eu vi que tinha depositado 50 euros a menos do que o valor do curso. Que dia de cão! Dormi muito mal durante a noite pensando em como eu iria explicar em francês que tinha esquecido de depositar parte do dinheiro.
Acordei cedo hoje de manhã, tomei um café reforçado, pois não sabia que horas iria me liberar, e fomos até a Sorbonne. Pra minha sorte, o Douglas ainda não começou as atividades dele e pôde me acompanhar. Chegando lá, o recepcionista pegou a minha convocação, me deu uma ficha para preencher e pediu para sentar naquela cadeira (tinha uma cadeira específica para eu sentar), com umas 20 pessoas na minha frente. Não entendi muito bem por que tinha que ser exatamente aquela cadeira, mas ele fez questão de me acompanhar até lá e disse: essa aqui! Ao correr da carruagem eu entendi: conforme as pessoas eram chamadas, o próximo pulava uma cadeira e o restante da fila também. O primeiro da fila era chamado e o os próximos... voilà!, pulavam uma cadeira. Na verdade, era uma fila normal, só que em vez de dar dois passinhos, você dava um pulinho pra outra cadeira. Nunca vi isso em toda minha vida!
Depois de experimentar as 20 cadeiras do lugar, fomos chamados para a outra sala, que para mim seria a sala da inscrição. Mas não; eram mais umas 10 cadeiras. Inacreditável!. Quando vi a cena tive que rir, e os companheiros de espera estavam no mesmo clima: pulavam uma cadeira e davam risada ou faziam uma piada da situação. 30 cadeiras e, finalmente, fui chamada para fazer a inscrição.
Depois da descontração dos saltinhos, eu já estava muito tranquila. Fiz a inscrição sem problema algum, consegui explicar a questão do depósito a menor, paguei os 50 euros e já recebi a minha carteirinha de estudante. Sou a mais nova aluna da Sorbonne e vou começar as minhas atividades antes mesmo que o Douglas. Amanhã cedo já vou fazer a prova de nível e, dia 6 de outubro, começo o meu curso.
Saí da Sorbonne feliz da vida. Ainda fomos dar um passeio pelo Arco do Triunfo, pela Champs Élysées e pela Praça da Concórdia. Pegamos três metrôs para casa e, na estação de Montparnasse, que é uma das maiores por aqui, têm uma esteira rolante para as pessoas não terem que caminhar, mas na qual todos caminham. Eu estava tão contente e sem pressa que, pela primeira vez, fiquei parada na esteira e aproveitei para contar em voz alta e em bom português as pessoas que passavam apressadas por nós: um panaca, dois panacas, três panacas... 64 panacas!
Nada como um dia após o outro. Aqui na França, estou tendo todas as oportunidades de controlar o meu temperamento. Amigos e amigas, se as coisas continuarem assim, vou voltar para o Brasil falando francês, com certificado da Universidade de Paris e totalmente zen!