Hoje o sol nos acompanhou o dia todo. E que dia! Tivemos a brilhante ideia de visitar a Cinemateca de Paris. Demos uma conferida na internet pra saber os horários e descobrimos que, no domingo, até à uma hora da tarde, a entrada para o museu da cinemateca é de graça. Já era meio-dia, mas resolvemos tentar. Tudo é tão caro aqui em Paris, que temos que aproveitar ao máximo essas promoções.
Pegamos dois metrôs até lá, mas mesmo assim conseguimos chegar faltando dez minutos para a uma. Ainda bem que o francês já está mais fluente, pois tivemos que nos defender da moça do atendimento que “não lembrava que era de graça”. Depois de explicarmos que vimos na internet, ela confirmou com um colega e entramos no museu sem pagar um euro.
A cinemateca, que foi fundada em 1936 por Henri Langlois, Georges Franju, Jean Mitry e Auguste Paul Harle, tem dois andares de museu. Pra quem gosta de cinema o lugar é o paraíso: parece que você está passeando pelos cenários dos filmes que mais gosta. As salas são pretas e você tem que ficar atento para captar tudo que o lugar tem para mostrar, pois até no chão são projetadas imagens. Além disso, o som parece que caminha atrás de você, e uma mesma sala chega a ter três filmes passando ao mesmo tempo.
Entre as obras expostas, estão alguns figurinos, como um manto de mago utilizado no filme de Georges Melies “Voyage dans la lune”, de 1902; a roupa de papa de Ringo Starr no filme “Lisztomania” de Ken Russel, de 1975; a capa e o vestido da atriz Stacia Napierkowska no filme “Atlântida,” de 1921, e a roupa vestida por Albert Lambert em 1908 no filme “L’assassinat du Duc de Guise”.
Além disso, há acessórios e maquetes: a caixa preta e amarela usada pelo ciclista do filme de Buñuel “Un chien andalou” e a cópia em tamanho natural do robô do filme “Metrópolis”, de Fritz Lang, que quase me fez chorar com o cenário do filme ao fundo e, no chão da sala, uma parte do filme sendo projetado.
Para quem gosta do expressionismo alemão, há muitas coisas sobre “O Gabinete no Dr Caligari”, inclusive quadros e cartazes da época. Já para os fãs de Charles Chaplin, há um espaço especial reservado a ele, com três engrenagens originais usadas no filme “Tempos Modernos”, fotos, pinturas e um auto-retrato de 1920, que de tanto que amei, tentei reproduzir no desenho abaixo, já que é proibido tirar foto.
Há muitos cartazes de filmes antigos também: La dame aux camelias, de 1911, com uma inscrição “film d’art”, o que já deixa transparecer uma intenção de distinguir o que é cinema de arte e o que não é, e “La Belle et la Bête”, do Cocteau, de 1946, tem um cartaz tão grande que faz no mínimo dois dos cartazes atuais.
Outros objetos também ajudam a contar a história do cinema. Tem até uma estatueta do Oscar ganha por Henri Langlois em 1974; um exemplar da revista Cahiers du Cinéma de 1968 e ainda câmeras e engenhocas dos mais variados tamanhos, cores e épocas, como a “Lanterne de projection” (1888 e 1989), “revolver photographique” (1873), a Lanterne magique polichrome (1860), o Praxinoscope (1879), o kinetoscope de Thomas Edison (1894-1895), o Thaumatrope (1826) e a câmera chronophotographique (1886).
Na cinemateca, também se pode ver muitos clássicos passando nas diversas telas espalhadas pelo museu: Acossado, Tempos Modernos, Metrópolis, Um cão andaluz, Atlântida, Lisztmania, A estrela do mar, o Gabinete do Dr Caligari...
Quando terminamos de ver tudo, a vontade que tínhamos era de voltarmos para o início, como aquele livro que você termina e fica tentado a reler no mesmo instante. Demos mais um giro pelo local pra ter certeza de que não tínhamos deixado nenhum clássico pra trás e saímos do lugar como se o melhor filme que vimos até hoje tivesse acabado.
A cinemateca fica praticamente dentro do parque Bercy, então, na saída, resolvemos conhecê-lo. Outra surpresa: um parque cheio de canteiros com flores, folhagens e verduras. Me fez até lembrar da horta da minha avó de tão bonito que é. As pessoas, como é costume aqui em Paris, ficam sentadas ou deitadas no gramado, lendo, conversando ou comendo. Caminhamos umas duas horas pelo parque; depois compramos comida, sentamos na grama ao sol como os parisienses e matamos a fome de horas
Saindo do parque, encontramos a Passarela Simone de Beauvoir, que dá, nada mais nada menos, que na Biblioteca Nacional da França. Passamos por ela e pegamos um ônibus para casa para ver melhor a cidade. O metrô seria mais rápido, mas como é subterrâneo na maior parte do seu trajeto, não conseguiríamos ver as ruas.
É, tem dias em que ficamos indignados com a burocracia francesa; mas tem outros em que você cai na real e percebe que está numa das cidades mais lindas do mundo, com mil coisas pra fazer, mil lugares pra visitar e com muitos parques floridos para passar num domingo de sol com o amor da sua vida.
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